Quanto mais doce melhor
Liguei o velho radinho da sala de estar. Procurei nas caixas empilhadas perto da janela algumas fitas. Sabia que as tinha deixado ali em algum lugar. Comentei com a Clarisse, da rua do lado, que precisava me tornar mais doce. Ela brincou, disse que sou puro açúcar, mas me nego a acreditar, tornei-me bruta. Então serei doce, diabética, quanto mais doce melhor. Vou ser bruta de início, mas juro que terminarei sendo doce. Tenho que ser, estou ouvindo canções que chamariam formigas de tão açucaradas. Ou posso ser o enlaçar dos dois, a grosseria em doçura. Mas eu te amo. Você levanta da cama, coloca o seu colchão no chão, escolhe uma música, ou me pergunta o que quero ouvir. Não me importa a canção, ouço o que toca lá fora. A cidade silenciando enquanto tua boca corre entre meu pescoço. Ouço a noite que se cala e se deita pra nos observar. Isso que eu ouço, tua respiração ofegante, as águas do mar que correm de tão longe pra transbordar nos nossos pés, nos fazendo ir cada vez mais longe. Ouço a tua voz dizendo que não sabe onde isso pode nos levar. Tornando a escuridão tão forte que vi estrelas morrerem aquela noite. Lembro de olhar firmemente pro mar, uma tentativa falha, se me permite dizer, de evitar que minhas lágrimas se debruçassem junto com a correnteza da água negra. Mas eu menina-moça que sou, tenho uma teimosia em mim que você vê de longe, ela grita nos meus olhos e se distorce nos meus lábios num sorriso desafiador. E procurando andar em pedras, em vidro, em fogo - ando no que for preciso, se souber que no final uma massagem espera meus pezinhos feridos do trabalho duro. E veja só, ontem, 20 de setembro, em algum horário entre a novela das sete e a das nove, eu estava deitadinha com você. Sinal de que os pés encontraram repouso. Havia parte de mim que sabia que não ligar era a solução. Eu quis fazer da situação gato e sapato. Eu era o gato, você o rato e não o inverso. Mas não para brincar, só que você era versão 2.0 masculina e eu meu bem, a feminina. Você não ligava daí, eu não ligava daqui. E aí foi um sorriso, foi um gesto, uma palavra, um mistério, uma experiência de vida, um beijo, dois, mais um, um carro na praia de madrugada, uma mensagem perdida, mais uma saída, outra e outra, escolher parar e não conseguir, ir, ir, ir, primeiras histórias escritas, como aquela do brother eu acabei de chegar mas já estou de saída, e rodar a cidade inteira procurando por coisas que não se devem mencionar, eu e você, suas mãos nas minhas enquanto dirige, ah, garoto! Já estou sendo doce outra vez? Se eu exagerar, me avise. Quero deixar a calda no ponto certo. Eu não sei ao certo em que momento me perco. Silencio e me torno um pouco aérea, voltando pra realidade apenas quando te ouço perguntar o que houve. Nada. Não houve nada. É só que ás vezes as coisas estão bem demais e eu não estou acostumada com isso. Parece que o bom a qualquer momento pode... explodir-se. A tua voz cantando junto com a música que sai do antigo dvd no seu carro, os teus olhos verdes, bem clarinhos quando em algum momento da noite você me faz acordar e aí está brincando de passear no meu corpo, a forma que você segura firme os meus cabelos e me dá aquele teu sorriso e quando você diz que adora a minha cara de zangada - desmontam o que quer que possa haver de triste em mim. Preciso de outros momentos como esse fim de semana em quase lua-de-mel. Esse silêncio nosso, silêncio de segredo. Eu gosto assim. Eu tenho mil coisas que gostaria de te falar. Nossa, milhões e milhões e passaríamos a noite de hoje, de amanhã e depois e depois. Então, não vou contar. Farei como em Mil e uma noites, um pedaço do conto por vez, pra manter meu bem aqui. E quando falo isso lembro de você dizendo que não precisa mais arrumar desculpas pra encontrar comigo, porque agora isso vem naturalmente. Eu aceito acordar todos os dias como esse último fim de semana. Aceito receber teus beijos amanhecidos, e despertar você. Aceito aqueles banhos quentes, sem problema algum, mesmo que eu fique de dedos enrugados, aceito de bom grado encostar meu corpo no teu, tomo banho de costas pra você, pra que assim você me abrace bem forte por trás. Aceito de coração sentar na escadinha e te ver preparar nossa comida e depois varrer a casa enquanto você limpa o fogão pra não estragar minhas unhas que você tanto gosta. Sento todos os dias no mesmo lugar na mesa, perto do seu, só pra ficar te vendo comer. E inventar nossas comidinhas, desde o filé de peixe que não saiu à milanesa até o melhor bolo de aniversário que pode existir no mundo, só porque foi você quem me deu. E ouvir você dizer que me alimenta bem, quando eu acordar dizendo que estou caindo de fome, sorrindo, porque sei muito bem o que vai ser a refeição. E assim, permaneceria, permaneço, do teu lado pro resto da vida, como quando você me disse: eu te amo, pra sempre. E ganhou mais do que nunca esse meu coração, que era bruto antigamente, mas que agora tá mais derretido que calda de chocolate quentinha. E por falar em coisas quentes, bem, você entendeu, deixo em silencio a lembrança que guardo em nós dois.
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